Ativismo Corporativo: Como não se tornar no vilão
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Por: Janine Oliveira, Customer Success Manager Martech Digital
Meio: Exame (4 de janeiro 2024)
Nos últimos anos, assistimos a um fenómeno fascinante no mundo dos negócios: o ativismo corporativo. As empresas estão tão preocupadas com questões sociais, ambientais e políticas, que acabam não só por vender serviços ou produtos, mas também tentam ajudar a salvar o mundo. Pelo menos, deveriam.
Neste momento, a linguagem corporativa mistura palavras como sustentabilidade, estratégias ESG, crise climática, descarbonização, justiça, inclusão, igualdade e economia circular. Não basta ter um bom produto ou serviço. O mercado encontra-se fervoroso e as empresas estão sempre à procura de algo que as faça destacar da concorrência – Só assim conseguem um relacionamento sério com os seus clientes, parceiros e colaboradores.
Aparentemente, as empresas B2B têm uma abordagem mais conservadora do que as B2C e acabam por viver “na sombra” quando se trata de causas sociais e políticas. Mas, atualmente, o silêncio pode ser mais negativo do que positivo. Segundo o inquérito “Purpose Perception” da Cone/Porter Novelli, 78% dos entrevistados indicaram que são mais propensos a lembrar-se de uma empresa com um propósito forte. No fundo, as pessoas querem que as empresas tenham opiniões. Por isso, não podemos esquecer que empresas são formadas por pessoas que as representam.
Um exemplo recente, é o caso do ex-CEO da Web Summit, Paddy Cosgrave e os seus comentários pessoais sobre o contra-ataque de Israel aos terroristas de Hamas, que levaram tanto Israel como grandes tecnológicas a desistirem de suas participações no Web Summit 2023. Estas consequências levaram à mudança de CEO da empresa e agora estão a tentar minimizar os danos causados.
O ativismo corporativo permite que as empresas se tornem “mais humanas” e que consigam criar uma conexão com o seu público. A forma como se posicionam em relação a essas causas pode afetar a sua imagem e reputação. Parece óbvio, mas não é uma boa ideia fazer apenas para parecer bem – deixemo-nos de greenwashing e de maquilhar o que realmente impactamos. As empresas não são filantropas. Por isso, antes de uma empresa considerar ajudar o outro, tem de organizar a sua própria casa.
O primeiro grande passo é ter os seus valores bem enraizados e uma cultura organizacional com uma abordagem holística. Tem de existir uma estratégia e convém que as causas defendidas, estejam alinhadas com a sua cultura e valores. Por isso, antes de se comprometerem com o exterior, as empresas devem ter um forte compromisso interno e uma liderança autêntica para integrar o ativismo corporativo no seu dia-a-dia.
Depois, construir um plano. Isto envolve a definição de uma missão ou causa que seja relevante para a empresa, a formação e envolvimento dos colaboradores e uma comunicação eficaz deste compromisso. Se a empresa tem receio de tomar uma posição “demasiado firme”, há que criar etapas viáveis e as ações podem ser realizadas de forma moderada.
Por exemplo, uma empresa de tecnologia que reduz o uso de recursos naturais ou transita para fontes de energia limpa nas suas operações – isto não é entendido como uma tentativa de parecer bem ou impulsionar as suas vendas. Ao contrário, esta pequenas ações refletem um empenho genuíno com a sustentabilidade, alinhado com a sua cultura e valores fundamentais de utilizar a tecnologia para o bem da sociedade. Ou seja, não é necessário “começar em grande”, o ativismo também está nos pequenos e sinceros passos.
Para além das vantagens financeiras, este compromisso pode mesmo combater o “calcanhar de aquiles” das empresas – a retenção de talentos. Quem não que trabalhar numa empresa que se importa? Perante um cenário de indecisão, onde os salários e benefícios se equiparam, o fator decisivo para a escolha da sua empresa pode ser o compromisso com questões ambientais e éticas. Os profissionais consideram, cada vez mais, a sustentabilidade e os princípios éticos ao escolher os seus futuros empregadores.
Desta forma, uma estratégia bem planeada pelas empresas pode criar conexões com os colaboradores e inspirar a lealdade pelos clientes. No fundo, o ativismo deve ser genuíno, enraizado em valores reais e não apenas um disfarce para impressionar. Se as empresas querem ser super-heróis e conquistar o coração de seus clientes, têm de ter um propósito e sinceridade naquilo que praticam. Senão, correm o risco de virar o vilão.
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